Em defesa da mulher
Publicado em 01.02.2010
Aproximam-se os dias de Momo e o mestre Capiba volta a ser cantado, pregando que “loira ou morena, não importa a cor, numa mulher não se bate nem com uma flor”. Pena que os versos da alegria ainda estejam tão distantes do drama cotidiano. Os juizados especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher são destinados a reparar um mal endêmico, que continua fazendo vítimas em pleno século 21. Em Pernambuco, as estatísticas levaram o Tribunal de Justiça a assinar um convênio com cinco municípios da Região Metropolitana, com o objetivo de criar novos juizados deste tipo, desafogando o juizado com este fim existente no Recife. Trata-se de providência oportuna, uma vez que a realidade é cruel com o sexo feminino no Estado. No ano passado, até novembro, 281 mulheres foram assassinadas em Pernambuco, segundo a Secretaria Especial da Mulher, e foram registrados nas delegacias 9.200 boletins de ocorrência tendo mulheres como vítimas. Após sete anos de funcionamento, o Disque-Denúncia no Agreste traz como primeiro motivo de ligação a violência doméstica, com 17% dos 47 mil chamados anotados. Não foi por acaso que, em dezembro, o governador Eduardo Campos sancionou a lei que instituiu o serviço de abrigo, atendimento e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar sob risco de morte.
O quadro no Estado reproduz algo infelizmente rotineiro no País. No balanço de quatro anos da Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180), do governo federal, de quase 800 mil atendimentos, metade dos agressores eram os maridos. No perfil identificado pelo serviço, as mulheres agredidas têm entre 20 e 40 anos, são casadas, e sofrem violência diariamente. A vulnerabilidade diante da prepotência que deixa marcas e cicatrizes físicas e emocionais torna-se ainda mais grave quando a justiça não consegue atender a contento a demanda de casos produzidos pela brutalidade doméstica. No juizado especial da capital, há seis mil processos em andamento. O volume é tão grande que uma nova unidade de atendimento será inaugurada, nos próximos dias, no bairro de Santo Amaro.
Em ação prevista no Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), o Ministério da Justiça e o TJPE repassarão recursos da ordem de R$ 2,1 milhões para a instalação desses juizados nas comarcas do Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Igarassu, Olinda e Jaboatão dos Guararapes. Além de cuidar para que as peculiaridades das agressões contra as mulheres sejam devidamente consideradas, o trabalho dos juizados especiais inclui a orientação familiar e o aconselhamento dos companheiros das vítimas, como enfatizou em entrevista ao JC a titular do juizado recifense, Maria Tereza Machado. De fato, a mera existência de espaços apropriados para a apreciação desses crimes pode servir como inibidor, levando para os municípios contemplados uma ação educativa que seja capaz de prevenir futuras ocorrências. De acordo com o presidente do TJPE, Jones Figueiredo, os juizados contarão com delegacia, defensoria pública, psicólogos e assistentes sociais, num esforço integrado visando a resolução rápida e eficiente dos casos recebidos, de maneira a evitar a reincidência.
Homens que espancam, coagem, humilham e até aprisionam as companheiras são o reflexo de uma cultura da covardia que está longe de ser exclusividade brasileira. Homens que se consideram superiores às mulheres por direito de nascimento, na verdade usam a força para exprimir a sua inferioridade moral. Por isso o discurso em favor do gênero frágil encontra, nos números da violência, razões de sobra para cobrar políticas de correção das desigualdades. Por outro lado, as consequências dos atos covardes se prolongam, muitas vezes, por toda a vida das vitimadas, incluindo sequelas psicológicas que podem resultar em depressão. Assim, toda iniciativa dos poderes constituídos em defesa da mulher - como a criação de juizados especializados - é uma iniciativa louvável, ainda que represente a triste constatação de que o problema da violência doméstica continua sem solução à vista.
Fonte:
Jornal do Commércio
Publicado em 01.02.2010
Aproximam-se os dias de Momo e o mestre Capiba volta a ser cantado, pregando que “loira ou morena, não importa a cor, numa mulher não se bate nem com uma flor”. Pena que os versos da alegria ainda estejam tão distantes do drama cotidiano. Os juizados especiais de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher são destinados a reparar um mal endêmico, que continua fazendo vítimas em pleno século 21. Em Pernambuco, as estatísticas levaram o Tribunal de Justiça a assinar um convênio com cinco municípios da Região Metropolitana, com o objetivo de criar novos juizados deste tipo, desafogando o juizado com este fim existente no Recife. Trata-se de providência oportuna, uma vez que a realidade é cruel com o sexo feminino no Estado. No ano passado, até novembro, 281 mulheres foram assassinadas em Pernambuco, segundo a Secretaria Especial da Mulher, e foram registrados nas delegacias 9.200 boletins de ocorrência tendo mulheres como vítimas. Após sete anos de funcionamento, o Disque-Denúncia no Agreste traz como primeiro motivo de ligação a violência doméstica, com 17% dos 47 mil chamados anotados. Não foi por acaso que, em dezembro, o governador Eduardo Campos sancionou a lei que instituiu o serviço de abrigo, atendimento e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar sob risco de morte.
O quadro no Estado reproduz algo infelizmente rotineiro no País. No balanço de quatro anos da Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180), do governo federal, de quase 800 mil atendimentos, metade dos agressores eram os maridos. No perfil identificado pelo serviço, as mulheres agredidas têm entre 20 e 40 anos, são casadas, e sofrem violência diariamente. A vulnerabilidade diante da prepotência que deixa marcas e cicatrizes físicas e emocionais torna-se ainda mais grave quando a justiça não consegue atender a contento a demanda de casos produzidos pela brutalidade doméstica. No juizado especial da capital, há seis mil processos em andamento. O volume é tão grande que uma nova unidade de atendimento será inaugurada, nos próximos dias, no bairro de Santo Amaro.
Em ação prevista no Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), o Ministério da Justiça e o TJPE repassarão recursos da ordem de R$ 2,1 milhões para a instalação desses juizados nas comarcas do Cabo de Santo Agostinho, Camaragibe, Igarassu, Olinda e Jaboatão dos Guararapes. Além de cuidar para que as peculiaridades das agressões contra as mulheres sejam devidamente consideradas, o trabalho dos juizados especiais inclui a orientação familiar e o aconselhamento dos companheiros das vítimas, como enfatizou em entrevista ao JC a titular do juizado recifense, Maria Tereza Machado. De fato, a mera existência de espaços apropriados para a apreciação desses crimes pode servir como inibidor, levando para os municípios contemplados uma ação educativa que seja capaz de prevenir futuras ocorrências. De acordo com o presidente do TJPE, Jones Figueiredo, os juizados contarão com delegacia, defensoria pública, psicólogos e assistentes sociais, num esforço integrado visando a resolução rápida e eficiente dos casos recebidos, de maneira a evitar a reincidência.
Homens que espancam, coagem, humilham e até aprisionam as companheiras são o reflexo de uma cultura da covardia que está longe de ser exclusividade brasileira. Homens que se consideram superiores às mulheres por direito de nascimento, na verdade usam a força para exprimir a sua inferioridade moral. Por isso o discurso em favor do gênero frágil encontra, nos números da violência, razões de sobra para cobrar políticas de correção das desigualdades. Por outro lado, as consequências dos atos covardes se prolongam, muitas vezes, por toda a vida das vitimadas, incluindo sequelas psicológicas que podem resultar em depressão. Assim, toda iniciativa dos poderes constituídos em defesa da mulher - como a criação de juizados especializados - é uma iniciativa louvável, ainda que represente a triste constatação de que o problema da violência doméstica continua sem solução à vista.
Fonte:
Jornal do Commércio
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