quarta-feira, 9 de setembro de 2009

A morosidade do MP prejudica direitos de soropositivos

A morosidade do MP prejudica direitos de soropositivos

Guido Rafael e Kariana Guérios // Advogados
gestos@gestospe.org.br

Há tempos o Ministério Público (MP) é visto como paladino da Justiça. Com a Constituição de 1988, suas atribuições foram aumentadas e seu papel no jogo democrático é fundamental. Questionar esta instituição pode parecer um crime atentatório contra o próprio Estado de Direito, mas é importante dizer que, em alguns locais do país, sua função de defensor máximo do (a) cidadão (ao) - por vezes - não está sendo desempenhada plenamente.

Como quase todo ordenamento, a previsão normativa e a realidade prática às vezes se afastam, e a nossa Constituição não foi exceção. Os especialistas, em sua maioria, afirmam que a Constituição de 1988 é uma das melhores do mundo: equilibrada entre direitos sociais e liberdades individuais, vasta em direitos fundamentais, severa em direitos ambientais e com um Ministério Público independente, ativo e operacional - imaginaram-no como operador e fiscal. Ocorre que a nossa Lei Maior, reconhecidamente muito mais programática que efetiva, parece estar voltada mais a um ideal futuro do que para uma realidade atual, e tal discrepância acaba gerando sérios danos aos cidadãos. Uma forte diferença entre a previsão normativa e a instrumentalização real gera sérios danos.

Ao Ministério Público foi atribuído um papel que, por vezes, não tem conseguido cumprir, tanto por falta de recursos suficientes quanto pela própria ideia que o Ministério Público deve atuar em certos processos.

Deve-se entender um processo como uma relação triangular - uma das partes requer um direito; a outra parte que contesta tal direito e um juiz. Obviamente outras tantas figuras giram em torno desse triângulo (terceiros interessados, técnicos, etc), mas a relação processual, a grosso modo, é um triângulo. Acontece que em certos processos o Ministério Público é uma das pontas desse triângulo (como no caso das ações penais) e em outras vezes não (ele é apenas uma das figuras que circulam o triângulo). Neste caso ele apenas está em volta, observando como está decorrendo o processo; se está transcorrendo de acordo com a lei. Assim, quando o MP é um mero observador, o juiz, na grande maioria das vezes, tira o processo de sua vara, manda para o Ministério Público, pede uma análise de um promotor, que deve responder e mandar de volta ao juízo original. Tudo isso seria justo e correto se funcionasse com rapidez.

O que vem acontecendo é que essas infinitas intervenções (chamadas de vistas) têm contribuído com a morosidade do judiciário. Aqui na Gestos - Organização Não Governamental, que trabalha em defesa dos direitos humanos das pessoas soropositivas - das 170 ações ativas, 55 estão paradas esperando essa intervenção e análise do Ministério Público. Obviamente essa demora não acontece só em ações envolvendo pessoas vivendo com HIV, mas sim em qualquer ação onde o Ministério Público intervém. É mais que comum ver esse tempo de resposta girar em torno de dois anos. Esperar 730 dias por uma mera opinião é absurdo!

É óbvio que, como qualquer instituição pública, há bons emaus funcionários. Há processos onde essa resposta foi célere e outros onde o tempo de resposta foi de 5 anos. Queremos aqui levantar um problema pouco observado: é importante falar bem do Ministério Público - uma das instituições mais respeitadas do Brasil - mas é democrático, também, questioná-lo. O judiciário acaba levando toda culpa pela morosidade e só quem é operador observa que o MP tem sim uma grande fatia de responsabilidade. Se é justo atribuir o devido a quem o possui de direito, é justo também chamar a responsabilidade do Ministério Público!

Publicado no Diário de Pernambuco

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