terça-feira, 13 de outubro de 2009

Clipping 11.10.09

JORNAL DO COMMERCIO - 11.10.2009 - COLUNA REPÓRTER JC

Desigualdade social
Publicado em 11.10.2009
Os últimos números do IDH, o índice de desenvolvimento humano, divulgados pela ONU, demonstram mais uma vez que o Brasil deve fazer da educação uma política permanente de Estado, independentemente do partido que esteja no poder. A educação continua o ponto que mais destoa o Brasil daqueles que lideram o IDH. Noruega, Austrália e Islândia, respectivamente, investem 35%, 31% e 36% de seus gastos públicos na educação. No Brasil, apenas 22%. O quadro, porém, é mais preocupante quando se sabe que o País investe 7% dos gastos públicos em saúde (menos da metade do que a Noruega (18%), Austrália (17%) e Islândia (18%)). Embora o Pnud mostre queda nos indicadores da desigualdade social no Brasil, a falta de melhoria da qualidade da rede escolar força o Brasil a ficar no grupo dos 10 países mais desiguais socialmente.

Homofobia e violência em discussão
A Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Alepe faz audiência pública dia 14 para discutir a violência contra homossexuais em Pernambuco.
ARTIGOS
Nações Unidas e democracia
Publicado em 11.10.2009
Marco Maciel
A Organização das Nações Unidas (ONU), que reúne 192 países, instituiu o 15 de setembro como Dia Internacional da Democracia. Trata-se de atitude coerente com as origens da instituição e, por isso, o atual Secretário-geral Ban Ki-Moon pode dizer que "sistemas democráticos são essenciais para se alcançar os objetivos de paz, direitos humanos e desenvolvimento no mundo".
No Ocidente, todos esses conceitos tiveram início com o célebre discurso de Péricles, em Atenas, três séculos antes de Cristo. Nele o orador apresentava os elementos fundamentais da democracia: governo "não de poucos, mas da maioria". E explicava o seu sentido ético: "não é o fato de pertencer a uma classe, mas o mérito, que dá acesso aos postos mais honrosos, inversamente, a pobreza não é razão para que alguém, sendo capaz de prestar serviços à cidade, seja impedido de fazê-lo pela obscuridade de sua condição".
E, para acentuar o pressuposto de que sem moralidade não se pode fazer democracia, explicava o estratego e político grego: "no tocante às leis todos são iguais para a solução de suas divergências privadas. (...) Ao mesmo tempo que evitamos ofender os outros em nosso convívio privado, em nossa vida pública nos afastamos da ilegalidade principalmente por causa de um temor reverente, pois somos submissos às autoridades e às leis, especialmente àquelas promulgadas para socorrer os oprimidos e às que, embora não escritas, trazem aos transgressores uma desonra visível a todos".
Já Robert Dahl, num de seus livros, afirma: "a Democracia não é uma fórmula particular de sociedade ou uma concreta forma de vida, mas sim um tipo específico de procedimento ou de técnica, em que a ordem social é criada e aplicada pelos que estão sujeitos a essa mesma ordem, para assegurar a liberdade política, entendida como autodeterminação".
Daí, podemos concluir que a democracia, como puro procedimento, carece de um conteúdo substancial: não garante que as normas de ordem social tenham de ser justas ou equitativas, que expressem o interesse comum, assegura, tão-somente, que todos quantos vivem sob sua sujeição tenham participado de sua criação.
Ademais, os conceitos elaborados pelo jurista Hans Kelsen nos levam, necessariamente, à distinção entre democracia representativa e democracia participativa. A Teoria da Representação é calcada na premissa de que os que tomam as decisões na democracia representativa são os representantes livremente escolhidos pelos eleitores. A eles cabe aprovar as leis que organizam a sociedade e o poder. Por seu turno, a democracia participativa significa um passo adiante: os representantes não apenas aprovam as leis. Devem votá-las, desde que atendam aos requisitos de justiça e equidade e exprimam o interesse comum.
Considerado sob esse aspecto, o fundamento ético de representação política e seu papel insubstituível consiste na necessidade de enfrentar e superar as novas demandas sociais. Quando isso não ocorre, o resultado é o surgimento de crises que se sucedem sem que, muitas vezes, saibamos qual sua causa.
Do tempo de Péricles aos atuais, o conteúdo da democracia foi sendo enriquecido pelas experiências históricas dos povos. Assim, a Constituição é a suprema formalização da democracia que, nos novos tempos, incorpora uma espessa declaração de direitos sociais e econômicos. As modernas cartas magnas, como a brasileira de 1988, acrescentam o reconhecimento de outras conquistas de direitos e deveres inclusive no campo dos direitos humanos e da preservação do meio ambiente. Mais do que nunca, o mundo necessita expandir, por toda parte, os valores da democracia verdadeira, autêntica. Democracia social, fundada na ética, com participação e igualmente atenta ao território da cultura, pois nele estão alojados os valores que definem a identidade dos diferentes povos e nações.
» Marco Maciel é senador e membro da Academia Brasileira de Letras

INTERNACIONAL
» AMÉRICA CENTRAL
Honduras: um país polarizado
Publicado em 11.10.2009
Após 3 meses de crise, sociedade hondurenha se divide entre os favoráveis e os contrários à volta de Manuel Zelaya, o que tem gerado até briga de vizinhos

Ricardo Galhardo
Agência O Globo
TEGUCIGALPA – Cena presenciada na capital hondurenha: um táxi freia bruscamente. Do carro sai uma mulher corpulenta, bolsa imitação de marca europeia a tiracolo, e grita: “Chavista! Chavista!” O taxista sai acelerando, mas antes responde no mesmo tom: “Golpista! Golpista!” A cena não durou mais do que alguns segundos, mas exemplifica a polarização causada pela crise política que se arrasta por mais de três meses. Em Tegucigalpa, quase todo mundo tem uma posição pró ou contra a volta do presidente deposto Manuel Zelaya ao poder.
Para os defensores do governo de Roberto Micheletti, os defensores de Zelaya são chavistas, alusão ao presidente da Venezuela, Hugo Chávez. O raciocínio inverso vale para os apoiadores de Micheletti, chamados de golpistas, por motivos óbvios.
São frequentes os relatos de desavenças entre vizinhos, colegas de trabalho e até pessoas da mesma família por razões políticas. Os motivos para assumir uma posição ou outra são distintos. Nem todos os que defendem a volta de Zelaya ao poder são simpatizantes do presidente deposto.
Muitos querem apenas a volta da normalidade constitucional quebrada pela deposição de Zelaya na madrugada de 28 de junho, quando o presidente foi tirado de sua casa ainda de pijamas e embarcado em um avião militar.
Outros são militantes do Partido Liberal (o mesmo de Micheletti) ou movimentos sociais de esquerda. Mas a grande maioria é de gente beneficiada pelas políticas sociais de Zelaya, a principal delas o aumento de 65% no salário mínimo.
“Era só abrir a geladeira de casa para perceber a diferença que este aumento fez na vida da gente”, disse a costureira Isabel Bolanos.
O mesmo vale para os favoráveis à manutenção de Micheletti. Nem todos são burgueses da elite hondurenha, como pregam os zelaistas. Muitos são pessoas que se sentiram prejudicadas pelas políticas de Zelaya, inclusive o aumento do salário mínimo. “Na empresa onde eu trabalhava, o patrão demitiu 15 dos 80 funcionários para reduzir a folha de pagamento”, disse o padeiro Élan Jaramillo.
Em alguns casos, até os argumentos, como a defesa da democracia, são os mesmos para amar ou detestar os dois presidentes hondurenhos. Para alguns, Micheletti é um bom político, mas merece deixar o poder por ter participado de um golpe de Estado. Para outros, os laços de Zelaya com Chávez e sua proposta de fazer uma nova Constituição representavam uma ameaça ainda maior à democracia, embora reconheçam que ele tenha feito um bom governo.
A única unanimidade é que a crise já dura tempo suficiente para criar fissuras na sociedade, que levarão ainda mais tempo para ser apagadas. “Uma ferida nunca se cura de um dia para o outro. Quando se passa a mão sobre uma cicatriz se recorda que ali houve dor, sangue e sofrimento”, disse o bispo-auxiliar de Tegucigalpa, Juan José Pineda, um dos interlocutores na tentativa de acordo político em Honduras.
Para a socióloga Julieta Castellanos, reitora da Universidade Autônoma de Honduras e uma das poucas analistas políticas isentas do país, mesmo que Zelaya volte ao poder e legitime as eleições do dia 29 de novembro, o próximo governo terá muito trabalho para recompor o tecido social esgarçado pela crise.
Segundo ela, a resistência ao golpe aglutinou diversos setores sociais antes vinculados aos principais partidos políticos, Liberal e Nacional, que há décadas dominam Honduras. Isso pode levar a um rearranjo das forças políticas e a um novo cenário partidário.
“Dependendo da forma como a resistência manejar isso, podemos evoluir de um sistema de partidos ideológicos para outro, de partidos de classe. Isso seria uma novidade enorme na política hondurenha”, disse.

ARTIGO
Lições hondurenhas
Publicado em 11.10.2009
Everardo Maciel
Honduras é um país pobre e pequeno, que se notabilizou como “República das Bananas” – caricata imagem cunhada pelo escritor americano O. Henry para salientar sua condição de republiqueta governada por políticos corruptos e submissa às vontades da United Fruit Company.
Entrou no foco das atenções mundiais pela deposição do presidente Manoel Zelaya, latifundiário eleito pelas forças conservadoras daquele país e que se deixou encantar pela retórica e pelos petrodólares do presidente Hugo Chávez.
Zelaya foi destituído por decisão da Corte Suprema, cumprida pelas Forças Armadas, após frustradas tentativas de convocar um plebiscito, sem poderes para tal, desafiando abertamente decisões tomadas pela Justiça e pelo Congresso Nacional. À sua destituição, seguiram-se a declaração de vacância do cargo e posse do sucessor em conformidade com a linha sucessória estabelecida pela Constituição.
Ressalvada a deportação de Zelaya, todas as medidas seguiram um rito absolutamente legal. Essa ilegalidade, todavia, não elide o crime de traição à pátria, capitulado na Carta Magna hondurenha, cuja pena é a imediata destituição do cargo ocupado. Além disso, o presidente deposto é réu em 18 ações, propostas pelo Ministério Público, algumas das quais por indícios de crime de corrupção. Seus aliados políticos saquearam residências e casas comerciais, para não falar dos que invocaram Hitler e sua perseguição aos judeus.
O histórico golpista latino-americano sancionou entendimento de que ocorrera um golpe de Estado, merecedor de condenação. No contexto de uma governança mundial, ainda imberbe, essa condenação evoluiu para aplicação de sanções econômicas, não reconhecimento do governo empossado e exigências intervencionistas para “restituir” Zelaya à Presidência.
A imensa maioria dos que condenaram o episódio, entretanto, não se debruçou sobre a legislação constitucional hondurenha, tampouco sobre os fatos que precederam a deposição. Reclamaram da inobservância de processos aplicáveis a seus países, sendo incapazes de perceberem diferenças históricas que explicam construções jurídicas distintas e que a Constituição de Honduras estava em vigor há 27 anos, tendo sido aprovada em ambiente democrático.
Qualquer jejuno que compulsar aquela Constituição vai constatar (art. 239) que a vedação à reeleição é cláusula pétrea. Qualquer iniciativa com esse objetivo implica imediata destituição das funções ocupadas pelo infrator e suspensão dos direitos políticos por dez anos.
É completa ingenuidade ou má fé não perceber que Zelaya tinha um claro propósito de perpetuar-se no poder. Para tanto, faria uso de qualquer meio, inclusive a via plebiscitária, na condição de aplicado discípulo da doutrina Chávez – uma espécie de cesarismo extravagante.
Admitamos, só para argumentar, que se entendesse como ilegal a destituição de Zelaya. Nesse caso, a via adequada seria o recurso à própria Corte que procedeu àquele ato. Recusar essa hipótese significa entender como ilegítimos os Poderes Judiciário e Legislativo daquele país. Por que, então, julgar legítimo o governo de Zelaya, eleito e destituído, em conformidade com o mesmo ordenamento jurídico no qual foram constituídos aqueles Poderes?
Surpreendente é a postura assumida pelo Brasil, principalmente, e por inúmeros outros países, em franca oposição aos princípios da não intervenção e autodeterminação dos povos, consagrados universalmente. Clamam contra a Constituição de Honduras, esquecendo de salientar que ela representa a vontade soberana do seu povo. Não exigem, entretanto, que o Reino Unido venha a ter uma constituição escrita, em respeito à tradição jurídica daquele país. Não se sentem minimamente incomodados com, entre outras, as ditaduras de Cuba, Coreia do Norte, Líbia, Gabão, Zimbábue, Mianmar. Não revelam o menor interesse pelo genocídio do Sudão, o banditismo na Somália ou a fragmentação do território da Geórgia. Centram suas atenções apenas em Honduras, porque esse país é pobre, pequeno e sem importância geopolítica, podendo converter-se em experimento descartável de governança global.
Honduras, contudo, poderá dar uma boa e digna lição de democracia ao mundo se conseguir manter-se na absoluta fidelidade à lei, mesmo se a solução para a crise for um arranjo político que consiga aplacar os intentos golpistas de Zelaya e seus tutores, a fúria dos insurgentes locais e a cínica indignação internacional.
» Everardo Maciel é consultor tributário

CIDADES
SEMANA DO PROFESSOR
Eles ensinam o que não aprenderam
Publicado em 11.10.2009
Resultado do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) revela as carências da formação de docentes no interior pernambucano

Margarida Azevedo
mazevedo@jc.com.br
Sete docentes da Faculdade de Formação de Professores de Petrolina, no Sertão do Estado, pediram demissão no último ano. O doutor em letras Bruno Siqueira, 34 anos, aguentou um ano e meio. Em tão pouco tempo, decepcionou-se com o que encontrou. Abriu mão da vaga no serviço público estadual, depois de constatar a dificuldade de realizar um bom trabalho na instituição, ligada à Universidade de Pernambuco (UPE). Seu desabafo é o mesmo de outros colegas de faculdades públicas do Estado. O resultado de Pernambuco no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) do ano passado, divulgado recentemente pelo Ministério da Educação (MEC), revelou a preocupação de Bruno: as faculdades de formação de professores, com poucas exceções, não preparam bons profissionais. Na semana em que se comemora o Dia do Professor, o JC mostra um grave problema: os futuros docentes chegam às salas de aula da educação básica sem ter aprendido, na educação superior, o que deveriam ensinar.
No Estado, mais da metade dos cursos de educação nas instituições públicas avaliadas no Enade tiraram notas baixas. Das 67 graduações em pedagogia e licenciaturas participantes, 38 tiveram notas 1 ou 2, consideradas as piores. Realidade que não está restrita às faculdades públicas. As entidades privadas também apresentaram médias baixas. No Brasil, dos 763 cursos de pedagogia avaliados, entre públicos e particulares, somente 32 (menos de 10%) alcançaram a nota máxima, 5. Neste grupo está a Universidade Federal Rural de Pernambuco. O Enade é uma avaliação aplicada todos os anos pelo MEC em diferentes áreas de conhecimento. Participam alunos que estão ingressando e outros que estão concluindo a universidade. O conceito Enade leva em conta apenas o desempenho dos concluintes. Vai de 1, o mais fraco, a 5, o melhor.
Currículos defasados, pouca relação entre teoria e prática, estágios sem acompanhamento correto e infraestrutura deficiente são ingredientes que fragilizam a formação de quem atuará como educador. “Na UPE, as faculdades funcionam como uma extensão do ensino médio. Nossa formação está mais para educação básica do que superior. Tem que haver prioridade para investimento nas licenciaturas”, ressalta o presidente do Diretório Central dos Estudantes (DCE), Divonaldo Barbosa, ex-aluno da UPE de Petrolina e atualmente aluno da unidade da UPE de Nazaré da Mata.
Para a coordenadora do curso de letras de Petrolina, Maria Aparecida Brandão, um dos maiores problemas é a carga horária extensa que os docentes precisam encarar. “Isso inviabiliza a pesquisa e a extensão. Há um professor substituto, por exemplo, que está com sete disciplinas este semestre”, conta. A vice-diretora da faculdade, Leilyane Coelho, reconhece os problemas, mas diz que medidas estão sendo tomadas para melhorar a qualidade dos cursos. Um prédio em construção, com previsão de conclusão no próximo ano, deverá sanar as dificuldades de infraestrutura. Também está em andamento um concurso para preencher 19 vagas de docentes e novos livros para o acervo da biblioteca serão adquiridos.
AUTARQUIAS
Em Serra Talhada, também no Sertão, Gláucia Carvalho, 30, cursa o penúltimo ano de licenciatura em matemática. Na instituição em que estuda, a Faculdade de Formação de Professores de Serra Talhada, há laboratório de matemática. Mas Gláucia entrou lá apenas uma vez para ter aula prática, embora esteja no sexto período. O curso tem oito semestres. “Acho deficiente a parte prática do curso, deixa muito a desejar. Mas acredito que a boa formação não depende só do professor ou da faculdade. Tem que haver também interesse do aluno”, diz Gláucia, que mora na cidade vizinha de São José do Belmonte.
A instituição ficou com três notas baixas no Enade – 1 em letras, 1 em matemática e 2 em história. “Contratamos uma consultoria para saber o que aconteceu. Mas nunca recebemos visita do MEC. Também não tivemos nenhuma orientação. Temos boa estrutura física e professores comprometidos com o ensino”, assegura o coordenador pedagógico da instituição de Serra Talhada, José Edmar Bezerra Júnior. A faculdade tem cerca de 1.400 alunos e atende a maioria dos municípios do Sertão do Pajeú.
Na UFPE, uma mudança no currículo das licenciaturas deve melhorar a prática dos alunos. A carga horária de estágio obrigatório dobrou, passando de 400 horas-aula para 800. Outra medida foi reduzir o número de alunos por turma, para que o professor possa orientá-los melhor. Em vez de 60, agora são 30. “Estamos realizando também um cadastro das escolas que recebem nossos alunos para estagiar. O controle do estágio está mais rigoroso”, conta a coordenadora das licenciaturas, Fátima Cruz. A UFPE ficou com nota baixa em geografia (2).
desabafo docente
Publicado em 11.10.2009

A minha experiência na UPE, do ponto de vista institucional, foi uma das mais decepcionantes. Esperava encontrar o que sempre persegui: condições dignas de trabalho numa instituição pública, que permitissem tornar-me um professor e um pesquisador ativo. Encontrei, no entanto, o contrário. Éramos constantemente pressionados a assumir mais disciplinas. Não me restava tempo para fazer pesquisa e extensão de forma responsável. Não bastasse isso, não possuíamos condições estruturais mínimas para realizar sequer uma etapa dos nossos trabalhos.
Não posso deixar de mencionar outros problemas, tais como a falta de ambientes adequados para orientação dos alunos. Só dispúnhamos da sala dos professores. Por vezes, essa sala se assemelhava tanto a uma feira livre que, para poder orientar meus alunos, submetia-me a ficar sob uma árvore no pátio da instituição e fazer a orientação em pé, durante uma hora.
Enfim, a sociedade pernambucana, de forma geral, não tem conhecimento de como o Estado tem relegado a condições indigentes suas instituições educacionais. No caso da UPE, os professores mestres e doutores que estão chegando à instituição com novos olhares, novas discussões, muitas vezes se sentem desmotivados em manter o trabalho, pois, a tomar como referência a faculdade de Petrolina, encontram-se em situação que muito lembra as péssimas condições das fábricas no período da Revolução Industrial.
Sem profissionais qualificados que formem professores também qualificados, os futuros profissionais da nossa universidade estadual serão constituídos dos próprios alunos que tiveram condição precária de estudo. A realidade da instituição universitária estará reproduzindo exatamente o que já ocorreu com nossas escolas estaduais: um sucateamento hoje difícil de reverter”.

Bruno Siqueira, 34 anos, doutor em letras, que pediu demissão da UPE este semestre
Salário é um obstáculo na carreira
Publicado em 11.10.2009

A precariedade da formação docente no País foi constatada também no estudo Professores do Brasil: Impasses e desafios, lançado semana passada pela Organização das Nações Unidas para a Educação e a Cultura (Unesco). A pesquisa mostrou que salário baixo é um dos principais obstáculos para os que decidem seguir a carreira docente. De um universo de 2,8 milhões de professores entrevistados, metade ganha menos de R$ 720. A situação é mais crítica na Região Nordeste, onde 60% dos profissionais recebem menos de R$ 530.
“Não é fácil formar um bom professor, sobretudo por ser uma profissão historicamente desvalorizada. Na maioria das faculdades, a base teórica é inconsistente. A prática também é inconsistente, o que resulta numa má-formação”, observa o professor Célio da Cunha, consultor da Unesco e coordenador da pesquisa. “Educação de qualidade é o que vai garantir o desenvolvimento da economia no Brasil. O problema é que educação ainda não constitui uma prioridade no País, que tem dinheiro para as Olimpíadas mas não tem para investimentos educacionais”, opina.
As professoras Bernardete Gatti e Elba Sá Barreto, responsáveis pela pesquisa, ressaltam a necessidade de uma verdadeira revolução nas estruturas institucionais e nos currículos de formação docente. “A preparação de professores para os anos iniciais da escolaridade em nível superior está sendo feita de forma precária. Os currículos não se voltam para questões ligadas à prática profissional, seus fundamentos metodológicos e formas de trabalhar em sala de aula. Continuam a privilegiar os conhecimentos da área disciplinar em detrimento dos conhecimentos pedagógicos”, enfatizam.
Elas destacam, ainda, a debilidade dos estágios e dos conteúdos dos cursos. “Os estágios, que são obrigatórios, mostram-se fragilizados, constam nas propostas curriculares sem planejamento e sem vinculação clara com os sistemas escolares, e sem explicitar as formas de sua supervisão”, afirmam. Para completar, ressaltam que, conforme informação dos próprios licenciandos, “os cursos são feitos em grande parte à base de apostilas, resumos e cópias de trechos ou capítulos de livros, ficando evidente certo grau de precariedade nos conhecimentos oferecidos”.
COMPETÊNCIAS
Na avaliação de Bernadete e Elba, as novas condições de trabalho docente exigem dos professores mais do que competências no ato de ensinar, “exigem qualidades e atitudes pessoais como interesse, paixão, paciência, vontade, convicções, criatividade e outras não passíveis de serem padronizadas, tampouco desenvolvidas em cursos e capacitações formais”.
A pesquisa mostrou ainda que houve grande expansão de cursos de pedagogia e licenciaturas em cinco anos. Em 2001, havia 1.224 cursos, passando para 2.415 em 2006, um acréscimo de 97%. As licenciaturas cresceram 52,4% nesse mesmo período: eram 3.307, em 2005 somaram 5.041. O Nordeste tem o segundo maior contingente de alunos de licenciaturas.
Faltam verbas, sobram problemas
Publicado em 11.10.2009
Enquanto nas universidades federais e estaduais o custeio vem dos governos, as autarquias, apesar de serem municipais, não recebem verba pública. Têm que se manter com o pagamento das mensalidades dos alunos, cujos valores não podem ser altos, pois a maioria dos estudantes é carente. Sem condições de pagar bons salários, fica difícil atrair professores doutores para o quadro. Em vez de dedicação exclusiva, a maioria recebe por aula-hora. O estímulo à pesquisa e extensão também é insuficiente.
Presidente da entidade que reúne as 13 autarquias municipais de Pernambuco, Bernardina Araújo questiona o resultado do Enade. “A avaliação feita pelo MEC é injusta e desigual. Considera como iguais os desiguais, tratando as autarquias com critérios de avaliações idênticos aos destinados às universidades federais. Avalia de forma igual instituições que têm oportunidades diferentes”, observa Bernardina.
“Não recebemos uma visita do MEC há mais de dez anos, não recebemos respostas sobre os relatórios de avaliação. Se há uma intenção de melhorar o ensino superior a partir dos dados do Enade, esse propósito ainda não nos alcançou, apenas nos puniu”, ressalta Bernardina. Para compor as notas do Enade e do Conceito Preliminar de Curso, o MEC utiliza relatórios e questionários enviados pelas instituições. As visitas às faculdades acontecem após a divulgação dos indicadores.
Para o presidente do Conselho Estadual de Educação, ao qual as autarquias municipais estão vinculadas, José Ricardo Diniz, a legislação falhou ao não inserir a obrigatoriedade de a entidade avaliar as instituições. É tarefa do conselho autorizar, credenciar e reconhecer as autarquias. Mas não cabe avaliá-las. “Nos preocupa o que mostrou o Enade. Mas o governo federal deve observar que a realidade das autarquias é diferente. Defendemos avaliação, mas com a participação dos conselhos estaduais.”
ESTÍMULO
Um exemplo de como investimentos do governo federal fazem a diferença é o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid), criado para valorizar o magistério e apoiar estudantes de licenciatura das instituições federais e estaduais. A iniciativa não contempla as autarquias municipais. Na UFPE, 53 alunos são beneficiados. Recebem uma bolsa mensal de R$ 350 para, supervisionados por um professor da universidade e outro de uma escola, ministrar aulas práticas. Na Escola Estadual Diário de Pernambuco, no Engenho do Meio, os estudantes de biologia Sandrine Arruda, 23, André Borba, 20, e Marcela Lopes, 21, tornaram as aulas da professora Ernestina Nascimento mais participativas. “Meus alunos estão mais curiosos e interessados nas aulas”, garante Ernestina.

DIÁRIO DE PERNAMBUCO - 11.10.2009 - VIDA URBANA
A saída pela educação
Em meio a preocupantes estatísticas de violência, crianças e adolescentes da periferia do Recife fazem opção pelo estudo e superam adversidades
Silvia Bessa // silviabessa.pe@diariosassociados.com.br

O destino cambaleava, espremido pelas paredes sem reboco e ruelas sombrias, nas vilas e comunidades pobres mais violentas do Recife. O caminho de pretos, pobres ou favelados é ser marginal ou ficar preso à exclusão social - uma voz cochichava no pé do ouvido de Delrípedes, Priscila, Max, Roseli, Tácio, Bia, Pedro, Gleison e Carla. Os garotos ignoraram a frase do senso comum.

Levantaram a cabeça e desviaram da personificação do futuro determinado e ameaçador. Driblaram e ainda driblam o fogo cruzado, andam perto da morte, convivem próximos ao mundo do tráfico e da prostituição. Seguem em frente como vencedores. Se destacam pela coragem extraordinária na batalha contra o inimigo e pela ousadia em alçar voos, passando por cima das previsões mais pessimistas. São incomparáveis exemplos de superação para estudantes de escolas públicas e particulares do Brasil. Para crianças e adolescentes ricos, de classe média ou pobres. A série de reportagens Meninos-Heróis que o Diario publica a partir de hoje até quarta-feira desvenda a identidade dos nossos anônimos heróis da resistência.

É um trabalho investigativo com matérias sobre educação. Elas trazem uma reflexão a respeito de desempenho escolar, dedicação, empenho pessoal e apoio familiar. Ao usar a violência urbana como pano de fundo, evita estigmatizar comunidades mas inova vinculando dois temas essenciais para o desenvolvimento juvenil - educação e segurança pública. Durante 20 dias a equipe visitou as áreas mais violentas da cidade para revelar os meninos-heróis do Recife. Foram utilizadas estatísticas da violência urbana por bairro como ponto de partida. Fomos ao Coque, Ilha Joana Bezerra, Vila dos Milagres, Ibura, Bode, entre outras comunidades de sete bairros diferentes. Os professores participaram do processo de seleção das crianças e jovens desta série. São meninos que podem exibir seus nomes por inteiro nos jornais, mostrar o rosto e contar como é trilhar o caminho do bem. A seguir, o resultado desse trabalho com o cuidado da apuração jornalística, entrevistas com mestres e especialistas em educação, relatos de aventuras e dramas em capítulos para serem repetidos na beira da calçada, na sala de estar ou na sala de aula.

No dia em que Delrípedes Rodrigo de Lima conseguiu colocar o pé numa escola tinha 12 anos. Para a família, favor de uma diretora. Ninguém o aceitava. Faltava um registro civil de nascimento. O único documento que possuía era um cartão de vacina, que a diretora aceitou como prova da identidade dele e permitiu a sua matrícula. Há sete anos, o filho caçula de dona Ivonete de Lima com um homem que o rapaz nunca viu corre com bravura atrás do prejuízo. Hoje ele tem 19 anos, e só agora tirou o registro. "Foi no dia 28 de agosto. Finalmente virei gente diante da sociedade", afirma. O papel timbrado, de nº 43.175, do 11º Distrito do Pina-Boa Vista, comprova o nascimento em 17 de maio de 1990, às 20h10.

Aluno da 8ª série da Escola Estadual Vila dos Milagres, com ótimas notas e ganhador do concurso interno de soletração, Del - como é conhecido na Vila dos Milagres, bairro da Cohab, onde mora - entra pela madrugada adentro com o livro aberto. À tarde, está na aula; pela manhã e à noite, trabalha. Formou no terraço de casa uma banca de reforço para a garotada da Vila dos Milagres. Lugar onde, segundo ele, "os meninos viram aviões do tráfico quando começam a falar". Del e seus alunos estão à margem da violência. A opção deles foi a de buscar uma saída pela educação.

"Não é porque sou pobre e moro em lugar violento que não posso conseguir o que quero. Serei delegado", garante Del. "Ele é muito inteligente e determinado. Vai conseguir, sim. Não interessa o tempo que vai levar", confia Ivonete, com os olhos marejados de tanta empolgação. Del cobra R$ 10 por mês a cada aluno da turminha para dar quatro horas-aula diariamente. "Não pode ser mais caro porque sei que as pessoas não poderão pagar", diz ele, que ensina português e matemática aos meninos e dá lições sobre valores morais e éticos.

O bairro da Cohab é considerado muito vulnerável para crianças e jovens pelos indicadores sociais (veja quadro ao lado). Foi o mais violento do Recife em 2008, com 44 homicídios, segundo dados do Observatório da Violência, da Secretaria deDireitos Humanos e Segurança Cidadã da Prefeitura do Recife. Para chegar à escola, às margens da BR-101, e à casa de Delrípedes, situada em um alto, foram muitas as recomendações à equipe do Diario. "Para lá não vá sozinha de jeito nenhum", insistiram pessoas com atuação na região. Lá é um lugar recusado por muitos mestres convidados a lecionar no local. Temem ser vítimas da violência.

O jovem negro que corre atrás do tempo perdido, ávido por uma oportunidade para aprender mais e preocupado com as crianças da Rua Cantora Dalva de Oliveira emociona. Na escola, é elogiado por professores e colegas. "Alunos como ele causam um impacto muito positivo sobre os demais", afirma o diretor da Escola Estadual Vila dos Milagres, Ezequiel de Paula. Na vizinhança, é saudado como "professor Del". Na última terça-feira um homem com um saco de laranja nas costas, roupas gastas, interrompeu a aula e, num gesto, resumiu o seu respeito pelo rapaz: cumprimentou Del com a palavra "professor" e estendeu a mão com uma fruta de presente. Saiu como se cumprisse um ritual. Del agradeceu e continuou o bê-á-bá. Com o incentivo, Willian e Williane, dois dos seus alunos, aprenderam a ler com fluência. Pablo, outro aluno, aprendeu o que é ditongo. "Del é um exemplo e, com certeza, está influenciando essas crianças", afirma Elizama de Souza, mãe de Willian e Williane.

O exemplo está na disposição em aprender e ensinar, nos dois casos sob péssimas condições. O birô do "professor Del" é a máquina de costura da mãe. A mesa saiu da cozinha da casa modesta e os meninos amontoam-se em cima de uma tábua de madeira apoiada por quatro cadeiras. O quadro negro tem meio metro. Na casa de Delrípedes vivem oito pessoas, com uma renda domiciliar média de dois salários mínimos.

Autoretrato
Por Gleison Nascimento, 15 anos, da Iputinga

Num lugar nada distante, margem da sociedade,
Há pessoas que esperam uma oportunidade.
Querem ser a diferença, não a marginalidade,

E batalham para isso, mesmo com a desigualdade.

As tentações sempre existem, promessas de vida fácil,
Mas aí, é se focar, e ter sempre a mente ágil.
Prá não se desvirtuar, é estudar, pegar estágio,
E seguir a vida em frente prá ter um futuro estável.

Nós somos sujeitos ativos, e devemos ser seguros,
Não estou dizendo que é fácil, pelo contrário, é muito duro,
Não pense que o crime é farto, pois é um tiro no escuro,
Independente de onde mire, prá onde você atire
Vai balear o seu futuro.

Gleison Luiz da Silva Nascimento - Aluno destaque na Escola Estadual Joaquim Xavier de Brito, bairro da Iputinga. Tem boas notas, desempenho elogiado pelos professores e já conseguiu uma monitoria em informática, um estágio numa empresa privada pelo seu empenho escolar. Faz teatro e declama. Sorridente, adora internet e é namorador. Mora no Caiarae vive cercado pela violência. Vê bem perto o envolvimento de jovens com drogas, mas diz que a sua geração precisa tomar uma decisão quanto ao lado com o qual quer ficar. Do bem ou do mal. Gleison escolheu o bem.

Sonho mantido com empenho e boas notas

Ser adolescente, estudante, dona de casa, mãe. Moradora da comunidade Ilha Joana Bezerra, estudante de uma escola localizada no bairro do Coque e integrante de uma família com baixa renda poderiam servir de desculpa para Priscila Roseno de Souza, de 16 anos, dar as costas para o sonho de ser psicóloga. O conformismo seria aceitável num universo onde a grande maioria dos estudantes acredita que concluir os estudos significa terminar o ensino médio. "Quando um dia cheguei em casa e percebi que havia perdido um estágio como recepcionista por morar onde moro, pensei que não poderia desistir", afirma ela. Agora, olha para a filha Bianca Vitória, de seis meses, com a certeza de que precisa persistir para oferecer um futuro melhor para a geração seguinte.

O sucesso de Priscila é daqueles que dá gosto de contar. Ela é aluna da 7ª série da Escola Estadual Joaquim Nabuco (muitos meninos com condição social baixa entram nas escolas fora de faixa etária), tem um boletim recheado de notas altas e é citada por professorese diretores da Escola Estadual Joaquim Nabuco pela maturidade e perseverança nos estudos. Estuda de manhã, cuida da casa durante o dia. À noite, enquanto balança Bianca no carrinho, empurrando-o com o pé, faz os deveres do colégio. "A gente já tem tanta dificuldade de crescer com estudo. Imagine sem estudo nenhum", pontua. Até parece uma adolescente qualquer. Adora cor de rosa, cadernos enfeitados com adesivos, canetas coloridas e é vaidosa. Mas o comprometimento com as tarefas pode ser resumido na decisão dela de voltar às aulas apenas um mês após dar à luz a filhinha.

A mãe que a criou sozinha é toda orgulhosa: "Quem sabe Priscila não chega na minha idade com uma condição melhor. Eu, sinceramente, sonho alto com ela", diz Adriana Roseno, dona de casa de 35 anos. As preocupações de Adriana Roseno são diferentes daquelas enfrentadas pela maioria das famílias de estudantes de escolas particulares do Recife. Adriana pensa na comida no dia seguinte, com quem os três filhos irão se relacionar. Na própria famíliade Priscila, tem relato de um jovem que perdeu o rumo, se envolveu com a criminalidade e acabou preso, contam.

Além da rotina de menina-mulher, lida com as dificuldades de morar num bairro com problemas estruturais e onde a criminalidade preocupa autoridades. A Ilha Joana Bezerra foi incluída como área prioritária para ações de enfrentamento e prevenção da violência. Nesse caso, por meio de programas de inserção educacional e profissionalizante.

Como o Coque, o bairro Ibura, do outro lado da cidade, também compõe a lista de prioridades pela violência que o cerca. Nele, também estão escondidas empolgantes histórias de jovens-heróis. Uma delas é a de Carla Karine, de 15 anos, da Escola Estadual Marechal Eurico Gaspar Dutra. Cursando o 2º ano do ensino médio, Carla prepara-se dia e noite para disputar uma vaga de bacharelado de ciências biológicas numa universidade pública. Carla estuda com disciplina cerca de quatro horas diariamente fora da sala de aula, faz intervalos para ouvir Ivete Sangalo e ajuda a irmãCarem Karoline, de 10 anos, nas tarefas. O lazer são as poucas horas de uso livre do computador que ganhou após se destacar como a única estudante de escola pública a vencer o concurso de redação Naíde Teodoro, em 2008. Evita sair na rua em virtude da violência. A família ainda está traumatizada com o assalto sofrido dentro da residência antiga, também no Ibura, há quatro anos.

Conheça o mundo dos nossos heróis

Buscamos relatos de vitoriosos meninos e meninas dos bairros mais violentos do Recife. Ibura, Santo Amaro, Cohab, Boa Viagem, Ilha Santa Terezinha e Iputinga aparecem entre os dez bairros da cidade com maior número de homicídios registrados nesta década - conforme revelam dados do Observatório da Violência da Prefeitura do Recife, com base em dados do Ministério da Saúde. As taxas de criminalidade foram pontos de partida para a busca de garotos e jovens bem-sucedidos. Nesses bairros, fomos às comunidades com os piores indicadores de pobreza, mortalidade, alfabetização e serviços básicos de abastecimento, coleta de lixo, água e energia. Incluímos também um ótimo exemplo da comunidade do Pilar (Bairro do Recife) por ele representar a superação da violência e de condições econômicas e de saúde precárias, como indica o último Atlas do Desenvolvimento Humano no Recife (do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento Humano, Pnud). O conjunto desses dados explica o porquê dessas crianças e jovens serem mais heróis que meninos. Abaixo, as peculiaridades de mundos que compõem essa matéria:

1 - Cohab
Está no topo da lista dos mais violentos do Recife em 2008. Registrou 44 homicídios em apenas um ano. A reportagem esteve na Vila dos Milagres, que é uma das comunidades pobres do bairro. Mais de 70 mil pessoas moram na Cohab - sendo cerca de 20 mil no entorno da Vila dos Milagres. Aqui, cerca de 40% dos adultos residentes são analfabetos ou têm menos de 4 anos de estudo; a maioria das moradias enfrenta problemas graves com a falta d'água (79,5% não têm água encanada) e 60% das crianças fazem parte de famílias com renda inferior a meio salário mínimo.

2- Santo Amaro
Vem perdendo posição no ranking dos bairros mais perigosos, devido a ações governamentais de combate à criminalidade. Mas ainda se situa entre os mais críticos. Uma média de 31 mil pessoas moram em Santo Amaro; metade na área próxima à Ilha Santa Terezinha, onde foi o Diário. O Atlas do Desenvolvimento Humano do Recife mostra um péssimo quadro no que toca a mortalidade até cinco anos (75 pormil nascidos) e a esperança média de vida (de apenas 62 anos). A proporção de pobres no bairro é de 56%. São consideradas pobres pessoas com renda domiciliar inferior a meio salário mínimo.

3 - Boa Viagem/Pina
É uma área recordista em violência. Boa Viagem e Pina juntas computaram 71 mortes por causas não naturais em 2008, segundo dados do Observatório da Violência da Prefeitura do Recife. Nesse aglomerado urbano, vivem em torno de 146 mil pessoas - somando-se também os recifenses de Brasília Teimosa, que fica no início da orla de Boa Viagem. A equipe visitou a comunidade do Bode, no Pina, zona onde cerca de 17 mil pessoas dividem-se num perímetro de 12 quilômetros. Lugar estigmatizado pela violência, é comprometido pela alta vulnerabilidade social - com palafitas, problemas de falta d´água e esgoto a céu aberto.

4 - Ibura
Abrange uma área ampla de cerca de 40 km do Recife e divide-se em três micro-territórios. Também possui alta taxa de criminalidade e preocupa muitoos governos estadual e municipal, tanto que integra a lista de bairros prioritários para programa de combate à violência (ao lado de Santo Amaro, Ilha Joana Bezerra e Iputinga). Nos últimos cinco anos, o Ibura foi considerado o mais violento em três anos (2004,2006 e 2007). A reportagem esteve nas áreas de planície e planaltos e nas proximidades da BR-101 Sul, algumas no limite com o município de Jaboatão dos Guararapes.

5 - Ilha Joana Bezerra/Coque
Está localizada nas proximidades do bairro de São José e reúne comunidades formadas a partir de terrenos alagados. É um bairro constante nas estatísticas da violência nesta década. O Diario visitou a Ilha, onde residem 16 mil pessoas - mais de um terço tem menos de 15 anos. Aqui, a taxa de mortalidade até cinco anos é alta (72 crianças por mil nascidos) e a renda da população é muito ruim. Os cidadãos têm renda per capita média de R$ 86,00 (diz o último censo oficial do IBGE) e a proporção de pobres é de 66%. Pior: esse percentual vem sendo reduzido a passoslentos (5% em entre 1990 e 2000).

6 - Iputinga
Passou a fazer parte dos quatro bairros nos quais os governos devem concentrar ações para redução da criminalidade e promoção da paz. Dividida em duas regiões, Iputinga agrupa mais de 34 mil moradores do Recife. A equipe buscou exemplos de estudantes do Alto do Céu, comunidades do Detran e Caiara. No pedaço do bairro onde se encontram as principais invasões e favelas, a situação educacional é muito ruim: a taxa de analfabetismo chega a 22,4% e a de pessoas adultas com menos de quatro anos de estudo fica em 35%. Ou seja, 58% dos cidadãos têm baixa instrução escolar.

Fonte: Prefeitura do Recife/Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Cidadã/ Ministério da Saúde/ Atlas do Desenvolvimento Humano (Pnud/ 2005)

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